Filantropia no financiamento da Pesquisa – Um exemplo a ser seguido
No Brasil, o financiamento da atividade científica é feito principalmente por órgãos públicos, sendo os mais importantes no âmbito Federal, o CNPq, a CAPES e a FINEP, e as Fundações de Apoio à Pesquisa, também conhecidas por FAPs, no âmbito Estadual. Os números mais recentes indicam que somados os orçamentos das três agências federais, o país deve investir aproximadamente 15 bilhões de reais em ciência e tecnologia em 2024. Somados os orçamentos das FAPs, tais números devem alcançar pouco mais de 20 bilhões de reais. Em números absolutos, tais orçamentos parecem muito grandes, porém, a título de comparação, somente com o fundo eleitoral, que tem por objetivo financiar campanhas partidárias, o país gasta hoje 5 bilhões de reais por ano.
Em praticamente todos os países do mundo onde existe algum investimento em pesquisa, a origem dos recursos é majoritariamente pública. Porém, diferente do que ocorre no Brasil, em alguns países, o filantropismo realizado por indivíduos, famílias, ou empresas, contribui de forma substancial com o montante anual do financiamento às atividades científicas. Nos Estados Unidos, o orçamento Federal anual para ciência e tecnologia é 220 bilhões de dólares, entretanto, o filantropismo adiciona mais 145 bilhões de dólares por ano nesta conta, o que significa que 40% do que é investido no setor, é oriundo de doações.
Apesar dos números muito discretos relativos ao filantropismo científico no Brasil, a Revista FAPESP, em uma matéria publicada na sua Edição 295 de setembro de 2020, forneceu evidências de que a prática vem aumentando nos últimos anos, e particularmente durante a pandemia de COVID-19, quando ocorreram doações consideráveis feitas por pessoas físicas para uso em projetos destinados a promover avanços na pesquisa nessa área.
Pode ser intuitivo pensar que os filantropos sejam sempre magnatas, donos de grandes impérios econômicos que destinem parcela desprezível de suas fortunas para o financiamento de pesquisa. De fato, doações vêm muitas vezes de pessoas ou famílias com tais atributos. No Brasil, por exemplo, a família Moreira Salles, criou o Instituto Serrapilheira (serrapilheira.org), instituição privada, sem fins lucrativos que financia atividades científicas com foco em jovens pesquisadores. Entretanto, pessoas comuns da sociedade também têm participado ativamente desta importante inciativa. Não existem dados consistentes a respeito da magnitude das doações feitas por cidadãos comuns, entretanto, nos Estado Unidos, aproximadamente 50% da população tem o hábito de fazer doações. Porém, neste caso específico, somente uma parcela das doações são destinadas à ciência e tecnologia, uma vez que os destinos preferidos para tais doações são alimentos e medicamentos para populações vulneráveis.
A maior parte da atividade filantrópica feita por pessoas comuns da sociedade, é intermediada por fundações ou organizações que coletam as doações e constroem fundos utilizados para tal finalidade. Entretanto, alguns filantropos preferem atuar diretamente, fornecendo doações para atividades específicas, escolhidas e definidas por eles. Este foi o caso da recente ação filantrópica da Professora Maria Isabel Pedreira de Freitas, professora aposentada da Faculdade de Enfermagem da UNICAMP. Bell, como é carinhosamente chamada pelos amigos, graduou-se em enfermagem pela Faculdade de Enfermagem e Saúde Pública da USP, Ribeirão Preto em 1971. Foi professora de Enfermagem na USP-RP, na Escola de Enfermagem da Universidade Estadual de Londrina e, entre 1997 e 2019 na Faculdade de Enfermagem da UNICAMP.
Além de ter atuado com destaque nas atividades de ensino e pesquisa, Bell foi a primeira Diretora eleita da então recém-criada Faculdade de Enfermagem da UNICAMP, entre 2014 e 2018. Foi também uma das fundadoras da Sociedade Brasileira de Nutrição Parenteral e Enteral, e é membro da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, desde a década de 1970.
No dia 5 de abril de 2024, a Professora Maria Isabel Pedreira de Freitas e a Universidade Estadual de Campinas, representada pela Diretora da Faculdade de Enfermagem, Professora Roberta Cunha Matheus Rodrigues, assinaram um Termo de Parceria no qual Bel faz uma doação “de uma Bolsa Pesquisa, em favor da Universidade Estadual de Campinas-Unicamp, SP e Faculdade de Enfermagem (FEnf) da Unicamp, no valor anual de R$ 32.000,00 (trinta e dois mil reais), pelo prazo indeterminado, enquanto a doadora estiver viva. O objeto do apoio será utilizado para Bolsa Pesquisa para discentes regularmente matriculados no Programa de Pós-Graduação em Enfermagem (PPG-Enf), nível mestrado, da FEnf-Unicamp, Campinas/SP.
Para pleitear a Bolsa Pesquisa, o candidato além de regularmente matriculado no Programa de Pós-graduação em Enfermagem deverá desenvolver sua Dissertação por meio da orientação de um docente permanente do mesmo programa, com a participação, na equipe de pesquisa, de um(a) enfermeiro(a), com no mínimo título de Mestre em Enfermagem, que esteja vinculado(a) a uma instituição de saúde pública e que atue na assistência, em serviços de atenção primária ou secundária ou terciária de saúde, com ações que contribuam para a busca de evidências no ambiente profissional ou correlato, em benefício do cliente e/ou de seus familiares. Os resultados e/ou produto da Dissertação deverão apontar evidências científicas, com aplicação prática no ambiente profissional.”
Além de efetivamente contribuir com a formação de jovens pesquisadores e com a atividade de ensino e pesquisa da Faculdade de Enfermagem, o ato de filantropia de Bell, é um exemplo que pode inspirar ações similares por parte de cidadãos comuns, resultando no aumento da capacidade de financiamento de projetos e alavancando a atividade formadora das universidades brasileiras.
Professora Maria Isabel Pedreira de Freitas e a Diretora da Faculdade de Enfermagem, Professora Roberta Cunha Matheus Rodrigues, durante a assinatura do Termo de Parceria.
Professora Maria Helena de Mello Lima, Diretora Associada da Faculdade de Enfermagem, Professora Roberta Cunha Matheus Rodrigues, Diretora da Faculdade de Enfermagem, Professora Maria Isabel Pedreira de Freitas e Professora Neusa Maria Costa Alexandre durante a cerimônia de assinatura do Termo de Parceria.